"Código Postal: A2053N” é o trabalho fotográfico de Pepe Brix que documenta a vida a bordo dos navios portugueses de pesca longínqua. Joana Princesa, um dos 13 sobreviventes da frota bacalhoeira portuguesa, foi o navio no qual o fotógrafo esteve embarcado durante três meses e meio.
“Código Postal: A2053N”, código de matrícula do arrastão Joana Princesa, é uma bela exposição de fotografia de Pepe Brix que o Museu Marítimo de Ílhavo faz questão de partilhar com o seu público.
As imagens documentam com realismo e sentido humano a realidade contemporânea da pesca longínqua portuguesa no Atlântico norte, mais precisamente na zona NAFO, onde a pesca do bacalhau por homens e navios portugueses persiste, teimosamente, invocando o tempo mítico da white fleet, dos lugres bacalhoeiros e de todo esse património que o Museu preserva como herança cultural de todo um País.
Há quem pense que tudo é passado e lenda na pesca do bacalhau. Que já não há navios em actividade, que a indústria de pesca foi há muito devorada pela burocracia e por erros de política. Não é bem assim. Basta visitar o porto de pesca longínqua da Gafanha da Nazaré, em Ílhavo, e observar navios e fábricas.
A exposição retrata o trabalho a bordo do Joana Princesa, um dos atuais treze navios polivalentes de pesca longínqua portugueses.
O fotógrafo esteve embarcado durante três meses e meio, convivendo com a tripulação, fazendo parte dela. As imagens são fortíssimas e quase fílmicas. Ontem como hoje, sugerem um excesso de real. Levam-nos a perguntar a nós próprios se seríamos capazes de fazer aquele trabalho, de ser parte daquele mundo flutuante. Não admira que este projeto tenha sido publicado, recentemente, na National Geographic Magazine.
A pesca hoje é muito diferente da de antigamente. Em cada ano, o Joana Princesa faz em regra duas viagens. Ao todo, os tripulantes passam cerca de oito meses no mar. Durante todo esse tempo, trabalham em condições difíceis e a mais de duas mil milhas de distância. Afinal, ainda temos os nossos Heróis do Mar.
Álvaro Garrido
Pepe Brix
Pepe Brix é um vagamundo. Esse mundo com várias pontas, unido por vários pontos, atravessado por uma infinita ponte, que parte e chega dentro do coração. É fotógrafo, o que equivale dizer que olha acima dos outros, que vê o que os outros não vêem e que observa a alma instantânea das coisas que falam devagar. Tudo começou nessa ponta do mundo, no meio do atlântico, chamada Açores, num dos seus pontos mais pequenos: a Ilha de Santa Maria. Nasceu em 1984 numa família habituada a estender pontes para os outros. Aprendeu o ofício sem o saber, que há linguagens que não se aprendem, mas que se desvendam, de forma cardíaca, ao som da música, no chão das cidades, na altura das montanhas. A fotografia foi, assim, o laboratório onde a humanidade se revelou um mistério fabuloso, por haver tantos rostos soltando pontas, por haver tantos pontos a serem cruzados e a ponte a seguir, feliz de ir em frente, mesmo quando recua. Do Porto à Hungria, da Califórnia ao Ecuador, da Índia ao Nepal, pontas que contaram a dimensão humana dos sentidos, expondo os pontos, erguendo pontes. Pontes que atravessaram cordilheiras e chegaram à Terra Nova, como navegador da retina humana, que tudo vê, mas nem sempre percebe o que regista. Por isso, o tamanho do seu coração, para caber o que uma moldura não aguenta: a frequência de uma humanidade que celebra a sua própria humanidade, acima de tudo.
Daniel Gonçalves